O falocentrismo continuará existindo o futuro?

Vamos conversar sobre a forma que fazemos sexo. Será nossa rotina sexual é algo inato ou socialmente preestabelecida? Olhando a priori, beijamos porque gostamos ou gostamos porque fomos inconscientemente ensinados a gostar?

Uma coisa que percebi ao longo dos anos, imersa em grupos feministas, e também de vivencia prática, é que muitas vezes o sexo segue uma rotina (a qual não fui necessariamente eu, você ou qualquer um que estabeleceu) mas que, pela conformidade do tempo e normas e mídias e sei lá mais o que, vem se propagando e hoje fazemos.

A questão é: ainda há muito falocentrismo no sexo! 

(Me refiro aqui exclusivamente às relações heterossexuais).

Como assim?

Boa parte desse sexo é voltada para o prazer do homem e passa boa parte do tempo, como o próprio termo já diz, em torno do falo.

O que isso significa?

Primeiramente que, sei lá eu como, ficou implícito que a mulher está gostando disso que está acontecendo. Tomemos por exemplo a penetração, sob a qual o sexo rotineiro tradicional tem um enorme enfoque. Apenas 30% das mulheres relatam ter orgasmos vaginais, enquanto 70% afirmam ter orgasmos clitorianos. Esse é apenas um dos dilemas clássicos em volta do falocentrismo.

Quantas vezes já observamos de fora a forma como fazemos sexo a ponto de ter questionamentos sobre a mecânica da coisa? A ponto de olhar para o outro com um olhar humanizado, abrindo espaço para entender como cada um de fato se sente, e não inferir sobre ele o que gostaríamos de ouvir?

Eu me esforço muito para não escrever o óbvio, mas numa sociedade em que tantas e tantas afirmam fingir orgasmos, bom, então pelo jeito não é tão obvio assim.

Obs: não sou contra aqui transar de acordo com a, se podemos dizer, rotina tradicional. A questão que quero por em pauta é, refletirmos se o que estamos fazendo está sendo igualmente prazeroso para todas as partes envolvidas.

Se sim, ótimo, vida que segue.

Então o fim do falocentrismo significa que devemos nos obcecar com a vagina?

Não. Assim como a solução para o machismo não é o femismo (crença de superioridade da mulher) e sim o feminismo, crença de que ambos tem direito a equidade. O fim do falocentrismo não é a “vagina-centrismo” mas sim a reciprocidade.

Uma coisa que não é tão aparentemente clara é que ambos os lados saem perdendo com esse enfoque tão gigantesco em órgãos genitais. Acabamos nos esquecendo de todo o potencial sensível e erótico pelo resto do corpo. Digo isso tanto no sentido mental como físico.

– Partindo da ideia de que sexo é psicológico, se estamos transando exclusivamente fisicamente, e ainda tendo esse físico focado majoritariamente em penetração, bom, no mínimo é valido confirmar se está gostoso para todos.

Empatia passa a ser mais do que uma palavra da moda, mas sim a ideia do dialogo, do construir juntos.

O texto de hoje é um chamado

Chamado para homens se flexibilizarem, se permitirem sair do estado machão: mostrarem sensibilidade, se abrirem para a vulnerabilidade de uma conversa sincera. E para mulheres, o chamado pra sair do silêncio, para falar mesmo, para não aceitar algo que não te satisfaz só porque o senso comum diz que é assim mesmo.

(Sem falar que caso você não encontre um espaço onde você possa conversar sobre a sua sexualidade sem ser julgadx, dá uma olhada aqui nesse vídeo da Jout Jout sobre relacionamentos abusivos só pra constar, ok?)

Até quando as mulheres vão se sentir abusadas durante o sexo? E aqui não falo de estupros, mas de relações intimas, com pessoas queridas, mas que infelizmente não tiveram esse ponto de inflexão para se por no lugar do outro, dando espaço para receber um feedback negativo se for o caso.

Mudar nossos olhos sobre a vulnerabilidade é essencial. Se colocar em um local vulnerável, principalmente quando falamos de um assunto tão socialmente tabu como sexo, não é uma atitude frágil, mas uma postura que demonstra muita força.

Deixo aqui esse manifesto para que possamos construir a forma como fazemos sexo respeitando, sempre, a individualidade de cada um. Por um futuro do sexo com menos falocentrismo e muito mais empático e recíproco! 

#prazerparatodxs #futurodosexo #boracontribuirfs

O falocentrismo continuará existindo o futuro?

| Comportamento, Sociedade | 4 Comentários
Sobre o Autor
- Estudando, construindo e vivendo o futuro do amor abundante.

4 Comentários

  • Felipe Gruetzmacher
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    Movimentos conservadores criticam propostas ousadas de repensar o sexo.

    Dizem que, por exemplo, o feminismo é um atentando contra a natureza, porque o feminismo repensa papéis sociais.

    Foucault, no livro “História da sexualidade”, volume 1, menciona as técnicas utilizadas pelo discurso cristão e mais tarde, pela medicina, psicologia, pedagogia e administração para extrair informações a respeito das práticas sexuais. No caso, emitia-se um diagnóstico sobre o que era normal e o que não era para preservar a boa saúde das classes abastadas.

    Assim, a ciência se atribui o poder de classificar. Tal poder não provêm de uma instância central, um Estado ou um governo, mas, de inúmeros pontos locais existentes na sociedade. Existe o poder quando uma família condena a masturbação do filho ou encoraja-o a casar. O poder implica em saber: um poder-saber sobre preferências, fantasias, opções, prazeres e amores.

    Um homem que não se esforça em entender os desejos da parceira ou saciá-la no sexo, na verdade, está exercendo um poder classificador sobre ela.

    Classifica o que é normal e o que é aceitável dentro do sexo, porque, segundo ele, é tudo natural e coerente com a biologia da mulher.
    Segundo essa perspectiva, repensar o sexo é atentar contra a biologia humana.
    Colocar o gênero como construção cultural e relativizar os papéis sociais é o início do fim da civilização.

    E como imaginar um sexo autêntico e prazeroso num contexto tão conservador?

    Até onde o feminismo pode relativizar os papéis sociais sem desrespeitar a biologia humana?
    Afinal, é fato de que o progresso da cultura humana se deslocou da evolução biológica.

    Não somos apenas biologia ou instinto, macho ou fêmea, mas, também, seres simbólicos.

    Como pensar o desejo sexual num contexto de comunicação instantânea e virtual promovida pelas plataformas (um claro exemplo de como o progresso cultural e tecnológico subverteu a nossa comunicação e, como consequência, a nossa biologia)?

    Há diversas ferramentas para a gestão e transmissão das ideias.

    Há, também, diversas plataformas para a cooperação, a colaboração e a construção mútua de significados.

    Colaborar significa escutar o que o outro tem a ouvir e, a partir disso, construir um conhecimento através de uma nova perspectiva sobre o fato apresentado.

    É muito mais, então, do que apresentar uma nova ideia, mas, participar de atividades de acordo com o estilo de vida e a psicologia interna de cada um.

    Um cirurgião é, na prática, uma pessoa paga para cortar outras pessoas. Logo, dentro da psicologia interna dele, há traços de sadismo.

    A maldade humana se manifesta em diferentes níveis e em diversos contextos.

    Logo, a plataforma e as tecnologias oferecem a oportunidade única de cada um se engajar dentro de uma atividade socialmente aceitável e capaz de expor a maldade humana de maneira produtiva.

    A inteligência coletiva precisa se envolver em diversos debates intelectuais e atividades edificantes capazes de integrar o lado mau e o lado bom.

    O compartilhamento de atividades servirá para que cada um possa encontrar uma habilidade capaz de mobilizar, não somente histórias pessoais ou traços positivos do caráter, como, também, defeitos emocionais inconscientes.

    É uma forma de integrar aspectos maldosos da sexualidade humana num namoro benéfico para ambas as partes através do engajamento em atividades culturais edificantes.

    A aceitação social decorre da exposição de uma personalidade madura e emocionalmente evoluída.

    Acontece, assim, um “dar e receber” na mesma intensidade.

    Como consequência, é a própria pessoa e não a ciência normalizadora ou a sabedoria falocêntrica que estabelecerá um tênue limite entre discutir papeis sociais e o respeito a nossa biologia.

    • Jade Chaib
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      Olá Felipe! Muito interessante a sua análise sobre o que está por trás dessa dinâmica de poder. Enxergo que muitas vezes vivemos apenas a superfície dessa realidade, sem aprofundar-nos em suas causas. Concordo totalmente com a ideia de que devemos, por meio do debate, utilizar a inteligência coletiva de forma a integrar o que é socialmente pré-estabelecido como “bom” e “mau”, tornando assim os indivíduos co-responsáveis.